domingo, 27 de fevereiro de 2011



                           A arte de calar

    Caro leitor, você acredita que a sabedoria de um homem está no discurso impecável que possa fazer ou no fato de conseguir dominar os seus impulsos e aprender a ouvir?

    Por muito tempo fui mal compreendida por falar tudo que vinha à cabeça, como diria minha avó “falava mais do que a nega do leite”. A verdade é que eu falava pelos cotovelos. Falar para mim parecia um impulso incontrolável. Aqueles que têm um temperamento menos contido sabem exatamente o que estou dizendo.

    Aprendi a duras penas a dominar os impulsos que me levavam a opinar a respeito de tudo. A convivência com meu esposo me ajudou bastante nesse processo de autocontrole.

    O texto intitulado “A arte de calar” do abade francês Joseph Antoine Toussaint Dinouart, foi crucial no meu aprendizado de ouvir mais e falar menos. O texto é de uma sabedoria incrível. Com ele aprendi “que só se deve deixar de calar quando o que se tem a dizer vale mais do que o silêncio”, portanto, se você não tem algo de bom para dizer para uma pessoa, é melhor permanecer calado. Quem nunca foi vítima de um comentário infeliz:  “mas como você tá gorda (o)”.

    Joseph também ensina que o homem nunca é tão dono de si mesmo quanto no silêncio. Fora dele, derrama-se, para fora de si, dissipando-se pelo discurso, de modo que passa a pertencer menos a si mesmo e mais aos outros.

    O clérigo também explica que quando temos uma coisa importante para dizer devemos prestar a ela uma atenção especial, dizendo a priori a nós mesmos e somente depois de tal precaução, voltar a dizê-la, evitando assim arrependimentos, quando já não se tiver mais o poder de voltar atrás no que foi declarado, afinal, somos senhores das palavras que não pronunciamos e nos tornamos escravos daquelas que proferimos. Complementa Mahatma Gandhi: “O homem arruína mais as coisas com as palavras do que com o silêncio”.

    Joseph acrescenta dizendo: “a reserva necessária para guardar o silêncio na conduta geral da vida não é uma virtude menor do que a habilidade e a aplicação em bem falar”. Para ele não há mais mérito em explicar o que se sabe do que em calar o que se ignora.

    O abade finaliza dizendo que o silêncio é necessário em muitas situações, porém é necessário manter sempre a sinceridade. Segundo ele, pode-se reter alguns pensamentos, sem, contudo camuflá-los. “Há maneiras de calar, sem, contudo fechar o coração; de ser discreto sem ser sombrio e taciturno; de ocultar algumas verdades, sem as cobrir de mentiras” acrescenta.

    Considerando as coisas de um modo geral, o certo é que, há menos risco em permanecer calado do que em falar tudo que vem à nossa mente. Quem nunca pensou que cometeu excessos em uma conversa com alguém? “O silêncio é uma das coisas em que geralmente, não há excessos a temer”  ensina Dinouart.

    Devemos nos lembrar que a imensurável sabedoria de Deus nos fez com uma só boca e com dois ouvidos a fim de estarmos sempre prontos para ouvir e tardios para falar. Afinal, palavras são sementes. Como diria Carlos Drummond de Andrade “Saber ouvir é um raro dom, reconheçamos. Mas saber calar, mais raro ainda”.

Por Liana Jacinto

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Rain
Não sei por que esse tempo de chuva traz um ar de melancolia mas de nostalgia também. O céu nublado resgata da minha memória lembranças da infância que os anos jamais trarão de volta.
Acredito que a chuva tem uma conotação diferente para cada pessoa, dependendo da história de cada um. Para mim especificamente ela representa um tempo de isolamento e reflexão mas representa também um tempo de medo e apreensão.
Lembro quando eu era criança, tinha por volta de uns 9 anos, houve um terrível vendaval em São Luis-Ma. Muitas casas foram atingidas no bairro em que eu morava com meus pais, então todas as vezes que o tempo nublava um medo assustador tomava conta do meu coração e eu me escondia dentro do guarda roupas, como uma borboleta dentro do seu casulo. Com o passar dos anos esse trauma foi sendo apagado, mas talvez seja essa a razão da minha relação pouca amistosa com o período chuvoso. Não são apenas lembranças ruins que tenho da época chuvosa, lembro também das brincadeiras de crianças despreocupadas no meio da rua.
Essa dualidade de sentimentos me deixa ilhada em meio aos meus pensamentos. Ouço uma boa música, sinto a chuva cair lá fora bem devagar e leio a palavra que alimenta o meu espírito e que me diz: “aquele que beber da água da vida, nunca mais terá sede”.
Penso nas vítimas da região serrana do Rio de Janeiro, impossível ficar indiferente a tanta dor e sofrimento. Centenas de mortos e de desabrigados. Tanta história de lamento que parte o coração até do mais insensível ser humano.
Penso na aliança de Deus com os homens de nunca mais destruir a terra por meio das águas. “Estabeleço a minha aliança convosco: não será mais destruída toda carne por águas de dilúvio, nem mais haverá dilúvio para destruir a terra”. (Gênesis 9:11). O arco-íris no céu anuncia que as chuvas cessaram e é o sinal dessa aliança entre Deus e a humanidade “porei nas nuvens o meu arco, será por sinal da aliança entre mim e a terra” (Gênesis 9:13).
A chuva tem em si essa dualidade, ao mesmo tempo em que traz inundação e destruição, é ela quem faz brotar as plantas e ervas do campo e é ela quem revigora os pastos, torna fecunda a terra e amadurece os frutos.
Depois de um longo período de inverno, de isolamento, de reflexão, o arco-íris despontará no céu e a borboleta sairá do seu casulo para alçar vôo.
Liana Jacinto

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

 
         Luto               
“Melhor é ir a um velório do que a uma festa”. A palavra de Deus é realmente infalível.

É duro ver um ente querido, que foi tão amado e que nos deu a satisfação do seu amor, ali inerte, sem vida, apenas um corpo já sem alma e sem espírito. Aquela imagem fria, gelada não mais se parecia com a pessoa da minha querida avó. Uma senhora esperta, de cabelos grisalhos e sempre pronta a contar uma história dos seus tempos de juventude.

Aquela imagem que há poucas horas dava seu último suspiro me confrontou e me fez pensar, repensar, enfim, refletir, impossível ficar indiferente. Já não havia mais o fôlego da vida. Bem ali naquele quarto de hospital, fiquei paralisada, vendo o corpo ser preparado para o funeral, lembrei de Shakespeare: “sempre devemos deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vejamos”

Mais uma vez eu pude entender o que o sábio Rei Salomão quis dizer. É no velório que repensamos nossas vidas e analisamos o que temos feito de útil aqui na terra. No velório somos lembrados da nossa fragilidade, de nossa mortalidade e que não fomos feitos para este mundo. Em uma festa as pessoas querem apenas viver intensamente o prazer momentâneo e experimentar uma alegria que é tão passageira. No velório não, todos choram a dor da perda, lamentam, mas também meditam a respeito das suas vidas.

Ficamos chocados, impotentes diante da morte, choramos e lamentamos, mas estamos certos de que aquela que se foi está na glória junto ao Criador de todas as coisas. A certeza de que há um lugar no céu preparado para ela é o que nos conforta.

A morte não é o fim, mas o começo da eternidade para os que crêem em Jesus Cristo e entregam suas vidas a Ele. Os que acreditam Nele jamais morrerão, mas passarão da morte para a vida eterna.

Liana Jacinto

sábado, 5 de fevereiro de 2011



Surge repentinamente, como o lobo a espreita de sua presa, insistindo em me atormentar. Inquietando a minha alma e trazendo lembranças que foram lançadas no mar do esquecimento. Talvez não seja por querer. Nem seja coincidência ou obra do destino, apenas algo provável de acontecer, afinal a cidade é pequena.

A hora já está avançada. O relógio na parede já anuncia a chegada de um novo dia. Daqui há poucas horas me levanto e me refaço. Insisto em não aceitar que as lembranças do passado me paralisem. Não permito que sejam abertas novas feridas, elas já foram cicatrizadas. Ô que bom que existe o esquecimento.

Sigo em frente, prossigo para o alvo, sem olhar para trás. Respiro fundo, concentro meus esforços naquilo que me faz feliz e que me traz alegria. Não há mais espaço para a dor e o sofrimento. O fardo não é mais pesado, tornou-se leve. As lágrimas foram enxutas e o coração preenchido pelo sorriso de uma criança.

                    Liana Jacinto